9 de outubro de 2011

O Filme Western: um pouco de história – parte 4

   Cena de My Darling Clementine    

¡Hola, muchachos!... Continuando nossa trajetória, que conta um pouco da história do cinema western, falaremos, neste texto, um pouco mais sobre
os anos 30, passando pelos anos 40, até chegarmos ao início dos anos 50, com High Noon.

Como vimos no texto anterior, os anos 30 não foram muito fáceis para o western de primeira linha. Com os drásticos efeitos da grande depressão, a indústria cinematográfica buscou driblar a crise criando os famosos programas duplos, que ajudavam a atrair o público oferecendo um pacote de diversão pelo preço de um único filme. Essa situação favoreceu o western B, uma produção barata, e que reinou quase absoluta por aqueles anos. Nestas produções destacaram-se nomes como John Wayne, Gene Autry, Roy Rogers e Ken Maynard, exímio montador e o primeiro cowboy a atrever-se cantando. Nesse período, com a chegada do som, houve muitas baixas. Muita gente que não se adaptou, como Tom Mix, mas a novidade acabou sendo fundamental para a  revitalização do gênero. 

 

Nas duas fotos, Ken Maynard, ator de westerns B,
 mostrando todo seu talento como exímio montador.













Assim, embora o período tenha sido menos favorável ao western A, produziram-se nesse campo algumas peças que valem citar. Entre os westerns A feitos nessa década, podemos destacar The Big Trail-1930 (A grande Jornada), Billy The Kid-1930, Law and Order-1932, The Plainsman-1936 (Jornadas Heróicas), Wells Fargo-1937 (Uma nação em marcha),  Jesse James-1939, o primeiro western de primeira linha a cores e Drums along the Mohawk-1939 (Ao rufar dos tambores), primeiro filme colorido de John Ford.


Henry Fonda  e Claudette Colbert
em Drums along the Mohawk.


Tyrone Power encarna o lendário
fora da lei, Jesse James.














Nesse período, dois filmes destacam-se sobre os demais. No primeiro caso, falamos do épico Cimarron-1931, de Wesley Ruggles, que conta um pouco da saga dos aventureiros em seu avanço rumo ao oeste. Podemos dizer que se trata de um melodrama feito com competência, e que carrega forte carga ideológica quanto aos valores dos homens da fronteira e dos ideais humanos e de liberdade, até hoje muito presentes no discurso americano. Cimarron foi o primeiro grande triunfo oficial, em termos de reconhecimento dado a um filme western pela crítica. Venceu o Oscar para melhor filme, roteiro adaptado e direção de arte, além de ter sido indicado nas categorias de direção, ator, atriz, e fotografia. Foi ainda o primeiro filme da história a receber 7 indicações ao oscar. No segundo caso, temos Stagecoach-1939 (No tempo das diligências), primeiro western de John Ford a ter som e a ser filmado no seu local preferido, Monument Valley. E como se isso não bastasse, ele foi também responsável por lançar John Wayne ao estrelato.



Nunca um transporte coletivo foi tão democrático.
Em Stagecoach, do figurão ao pé-rapado, todo
mundo amontoado numa diligência.

Cena célebre da corrida para o
território de Oklahoma, em Cimarron.















Stagecoach destaca-se por elevar o western a um nível artístico nunca visto antes. Baseado no conto Stage to Lordsburg, de Ernest Haycox, que, por sua vez, era inspirado em Boule De Suif (Bola de Sebo), um conto de Guy de Maupassant, Stagecoach explora com maestria os conflitos sociais e morais entre as personagens. Enclausurado no interior de uma diligência e prestes a sofrer um ataque de índios, um grupo, que conta com 9 pessoas, entre elas uma prostituta,  um banqueiro desonesto, um comerciante, um homem da lei e um fora da lei, tenta chegar ao seu destino. Ao montar essa galeria de tipos e explorar aspectos psicológicos, sociais e morais, através da relação entre eles, o filme faz uma pequena crítica à sociedade americana da época, e, de certo modo, oferece um panorama não muito anacrônico em tempos atuais.

Nos anos 40, o western continuou a trajetória iniciada em Stagecoach, buscando uma temática mais sofisticada e uma maior preocupação com o seu próprio lugar. Começava-se, então, a discutir o papel do westerner em uma sociedade que mudava rapidamente seu modo de vida, para um sistema industrializado, e onde o espaço natural e dentro da própria sociedade parecia reduzir-se para o antigo modelo de herói, exigindo uma atualização. Outro fator que influenciou decisivamente essa mudança foi a dura realidade da segunda guerra, que abalou o modelo romântico do herói americano.


O premiado diretor de westerns
John Ford.
The Ox-Bow Incidente, western sobre a cegueira coletiva.

Assim é que o western, que já gozava de boa maturidade, inaugurou um novo estilo, que passou a conviver com o estilo clássico, a que especialmente o crítico francês e cofundador dos Cahiers du Cinéma, André Bazin,  chamou Superwestern. Esta, portanto, foi uma tendência mantida e aprimorada nos anos seguintes, oferecendo filmes excelentes, como The Ox-bow Incident-1943 (Consciências Mortas), Pursued-1943 (Sua Única Saída), High Noon-1952 (Matar ou Morrer) e Shane-1953 (Os brutos também amam). Resumindo, o superwestern passou a incorporar elementos externos, enriquecendo-se com uma forte dimensão social, política, psicológica, e uma elevada carga de realismo. O Herói idealizado cedeu lugar ao homem comum, desajustado e cheio de conflitos. Sua angústia, suas  imperfeições, tomaram relevo. O caos social, a discussão sobre a ordem estabelecida, pouco questionada no modelo anterior, passou a ser explorada. High Noon discute isso: como alguém moralmente e socialmente engajado pode defender uma sociedade corrupta e incapaz de dar sua própria contribuição? O final é assombroso. O xerife Gary Cooper joga a estrela e a lei dos homens ao chão. Quanto a The Ox-bow Incident, trata-se de uma crítica mordaz à sociedade e aos grupamentos humanos. Filmando várias cenas em estúdio, Wellman acentuou um tom escuro e pessimista ao filme, criando uma atmosfera inquietante, algo que passaria a se fazer presente em westerns posteriores, como nos chamados crepusculares.



Gary Cooper procurando uma alma viva
na cidade, em High Noon.

Ainda assim um cara de sorte:
ganhou um oscar e ainda pôde
beijar e abraçar Grace Kelly.

Aqueles anos se permitiram ainda muitas outras ousadias, como acrescentar o tema do erotismo e da sexualidade, presentes em altas doses em The outlaw-1943 (O Proscrito) e Duel in the Sun-1946 (Duelo ao Sol), filmes interessantes e que naquela época representavam um desafio à ordem e aos bons costumes, chegando a ter um bocado de problemas com a censura.

 
Jennifer Jones e Gregory Peck
e seu amor moderno em pleno oeste.
Jane Russell exibindo seus dotes e provando
que o oeste já não era mais o mesmo.












Mantendo a tradição clássica, também foram feitos filmes muito interessantes, como My Darling Clementine-1946 (Paixão dos Fortes), Yellow Sky-1948 (Céu Amarelo) e Red River-1948 (Rio Vermelho). My Darling Clementine, por exemplo, que apresenta um perfeito Henry Fonda, encarnando o mito consciente de Wyatt Earp, é um filme enxuto e com excelentes referências aos costumes do oeste americano, e com uma técnica cinematográfica bastante apurada.

A travessia do deserto de sal, em Yellow Sky.
Joanne Dru em Red River, mostrando
pros marmanjos como é que se faz.
   

















Outro grande beneficiado com as novidades incorporadas ao western foram os índios. Rotineiramente vistos como arautos do mal, obstáculo ao desenvolvimento, ou simplesmente selvagens perigosos que precisavam ser domados a todo custo, passaram a ser vistos sob uma ótica mais realista, e as histórias começaram a apresentar a questão do índio mais próxima do seu ponto de vista. Broken Arrow-1950 (Flechas de fogo), de Delmer Daves ilustra essa nova situação, antes improvável em Hollywood: a defesa da causa do índio e a denúncia do preconceito e do tratamento nada respeitoso dado a ele, contribuindo de modo muito interessante para mudar a visão acerca da questão.


Em Westerner, Gary Cooper posando
de cigarro e tudo, 15 anos antes de James Dean.
Cochise aproveitando
os novos ventos.




















Enfim, esse foi um período prolífico e de intensa renovação no western e na abordagem acerca da figura e do papel do westerner. Renovaram-se os temas, mas mantiveram-se intactas as estruturas basilares do gênero. Todas essas mudanças continuaram se aprofundando nos anos seguintes, com grandes realizadores, entre os quais destaca-se a figura de Anthony Mann, de quem falaremos um pouco mais no próximo texto de continuação.

Ainda vários outros filmes interessantes foram realizados nesse período, mas não os citamos por não termos qualquer disposição em tentar ser exaustivos. Filmes como The Westerner-1940 (A última Fronteira), ou mesmo The Thesaurus de Sierra Madre-1948 (O Tesouro de Sierra Madre), que demandaria uma discussão à parte, dada sua grandeza e  a difícil delimitação no interior de um gênero.

Bom, aqui vamos apear um pouco para descansar.

¡Hasta luego, compañeros!






Abaixo, algumas imagens de filmes desse período:


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