Sempre houve tensões entre homens
e mulheres, assim como entre todas as vidas que habitam o planeta. Organismos,
plantas, animais sempre interagiram, complementando-se ou competindo
ferozmente. Alguma ebulição sempre foi necessária; seja na melodia que brota
entre sons harmônicos e rangidos, seja entre as cores, que proíbem o mundo da
monotonia de um único tom, e que, contrapondo-se em orgânica diversidade sobre
uma campina, ou sobre as folhas e pétalas de cada sol e de cada estação, criam
magníficos afrescos naturais, integrando-se e afirmando-se a si e a seus
parceiros de criação. Essa é a sinfonia e o mistério da vida. Uma beleza
superior, mas, justo por isso, difícil de ser compreendida.
Assim, como resultado da frágil
percepção dessa realidade, temos visto as relações entre homens e mulheres se
deteriorarem, de tal modo que, se nada detiver a marcha da insensatez, talvez
caminhemos para a efetivação da inacreditável e distópica guerra dos sexos, uma
guerra total, que praticamente nenhum efeito benéfico trará a qualquer dos
lados.
Deus, ou a natureza, como diria
um panteísta, fez os animais, além de tudo quanto existe, de uma substância
essencial a que o homem, somente quando tudo pronto, pôde então colocar as
mãos. Portanto, a sabedoria superior, aquela que permite o fino equilíbrio
entre tudo o que há, em tempo algum poderá ser subjugada. A lei universal é
indomável. Não pode severamente ser controlada. Alguém poderia odiar um vulcão
que expele larva em chamas, mas talvez não saiba que sem ele o mundo
provavelmente sucumbiria. Ou talvez possa detestar a existência do dia e da
noite, mas deveria saber que sem isso teríamos uma unicidade morta. Tudo o que
existe, até certos fragmentos do flagelo humano, tem uma razão, por mais
assombroso que a nós isso possa parecer. É graças a nosso apego e ao crescente
desejo de segurança que ignoramos isso, e a cada dia somos pessoas mais
inconstantes e indecisas, mais raquíticas diante da grandeza do mundo e do mistério
da existência.
A destruição física e mental que
hoje vemos ocorrer entre homens e mulheres evidencia isso. Acusam-se do
infortúnio um do outro. Desejam distância entre si e já não suportam a vida em
comum, aquela que outrora foi mais madura e desejada. Competem por espaço
social, econômico, e caminham, quando muito, para tirar proveito um do outro em
relações meramente ocasionais, livres de apreço, compromisso ou respeito.
Homens e mulheres detestam, cada dia mais, vínculos, responsabilidades mútuas,
e cada um vai sendo infeliz a seu modo, sozinho, mergulhado em mágoas, dúvidas
e frustrações. Assim, desperdiçam parte irrecuperável dos dias, e toda uma vida
baseada no crescimento e no amor, em cuja união se funda um projeto virtuoso de
vida. O problema é que hoje se espera que esse projeto seja perfeito, sem
angústias, sem perdas, sem desafios, e tendo como bússola o orgulho pessoal;
uma expectativa em conflito com a vida superestimulada que a modernidade nos
trouxe, repleta de inseguranças e baseada na imaturidade; assim, as uniões
quase sempre fracassam. A modernidade, com suas máquinas e redes sociais,
agravou o problema, insuflando nosso vazio existencial. Todos agora esperam
pela promessa do mundo ideal, segundo sua concepção torta, esquecendo que, se não
plantarmos as sementes certas e as quais conhecemos muito bem, semearemos um
futuro incerto, talvez de muito caos e sofrimento.
O mundo é imperfeito, as pessoas
não são boas como gostaríamos, e há, claro, coisas para melhorar, mas as
limitações do homem, da ciência e da fé precisam ser compreendidas e
reconhecidas. Tudo o que podemos fazer é limitado e, para ter chances de
sucesso, deve estar em harmonia com as regras do universo e da vida. O tempo e
o espaço são impiedosos, e sempre acabarão nos provando isso.
Portanto, homens e mulheres
precisam antes começar a se amar, a se entender, e a compreender o quanto um é
importante na vida do outro. São duas almas complementares; que não vivem em
competição sem que se sintam infelizes. Ambos sempre serão diferentes e
precisam aprender o respeito e a admiração mútua. Eis aí uma coisa importante:
as pessoas admiram a grandeza das outras, seja um intelecto privilegiado, uma
educação refinada, um olhar ou a beleza de gestos cativantes. Mas temos sido
tragados por uma subcultura de massa, que nos desumaniza e torna seres
espiritualmente rebaixados. Um espírito criativo, capaz de divertir com bom
gosto, de dizer coisas precisas e agradáveis, ou nem sempre, é uma alma de
inestimável valor, desde que dentro de uma cultura de altivez e dignidade. É
preciso ser sóbrio na essência; mas criança quando necessário, espirituoso para
agradar a quem se ama, gentil e educado para cativar os corações; virtuoso de
modo a que, sempre que se saia um pouco, não demorem a dar pela falta, não
tardem a sentir saudades.
Infelizmente, os crescentes
coletivos machistas e feministas têm ajudado a aprofundar o abismo. Homens e
mulheres devem viver em sintonia: cuidar um do outro, fazer as coisas em acordo
e resolvê-las segundo as habilidades de cada um. Não há problema em dizer-se
que o homem tira a lenha e a mulher acende o fogo. Para completar, sempre é bom
ter um papo gostoso, ler bons livros juntos, desfrutar a intimidade e a
sensualidade intensa dos corpos, usufruir as tarefas e o lazer comum, e,
finalmente, cultivar a boa índole e a boa educação dos filhos, sendo essa a sua
suprema tarefa. Esses viventes só se realizam quando alcançam esse maravilhoso
equilíbrio, como o equilíbrio do próprio mundo vagando no infinito. Todos podem
ser felizes de diversas formas, mas os céus se exultam, não porque qualquer
homem assim o queira, mas segundo a própria natureza da vida, quando há o
encontro iluminado de dois seres projetados para se completar: o homem e a
mulher.