27 de outubro de 2010

Diamante Lobo

















(aka Arma Divina, As armas de Deus, God’s Gun, A bullet from God)
País: Itália/ Israel
Língua: Italiano
Ano: 1976
Duração: 94 minutos
Direção: Gianfranco Parolini (Frank Kramer)
Fotografia: Colorida/1.78:1
Elenco principal:
Lee Van Cleef ( Irmão John & Lewis)
Jack Palance: Sam Clayton
Richard Boone (Xerife)
Leif Garrett: Johnny

Diamante lobo (Arma Divina) é um euro-western pitoresco. Feito quando a produção de westerns europeus estava em franca decadência, já não apresenta toda a estilização que caracteriza o western italiano, e que lotou os cinemas ao redor do mundo, a partir da segunda metade da década de 60. Não é, talvez por isso, também, um filme, como quase nenhum western o é, indicado para intelectuais e gente que curte o “cinema cabeça”, essa, mesmo que oca.
Possui um roteiro simples, que gira em torno do tão comum tema da vingança, porém enxuto, e bem conduzido por Parolini. De um modo geral, me agrada sua condução narrativa, com flash-backs e alguma quebra da linearidade. Claro que, em termos temáticos, há outras referências importantes, das quais o destaque é o tema da religião, tão caro ao western de origem italiana. Como se pode perceber pelo título, a história aproxima morte e vida, figurativizadas nos personagens gêmeos, interpretados com a habitual competência de Lee van Cleef, que são o padre da pequena Juno City e seu irmão Lewys, pistoleiro aposentado, refugiado no México. É talvez o euro-western a quebrar de forma mais peculiar o maniqueísmo presente nos westerns anteriores, de linha americana.
A história se inicia com um assalto, feito pelo bando comandado por Sam Clayton (Palance), ao banco de Crane City. Após roubar o banco da cidade e um de seus integrantes estuprar uma garota, o bando dirige-se à pequena Juno City. Chegando à cidade, o sobrinho de Sam Clayton comete um assassinato no Saloon de Jenny. Como praticamente todos na cidade se acovardam diante do bando, o Padre John, cujo passado esteve ligado a sua habilidade com armas, resolve sair, desarmado, à caça do bando, para entregar às autoridades o autor do crime. Após algumas peripécias, ele consegue entregar o culpado ao covarde xerife, interpretado por Richard Boone (aquele ator que brilhantemente interpreta o matador de índios em Rio Conchos). Instala-se aí o conflito. O bando organiza-se para resgatar o criminoso e vingar-se do Padre John, por fim, matando-o numa emboscada. É quando o pequeno Johnny, que ajuda o padre nas tarefas da igreja, resolve fugir sozinho pelo deserto em busca do irmão de seu preceptor, Lewys, o pistoleiro aposentado.
Para a tarefa, o garoto rouba dois cavalos do bando de Clayton, e carrega consigo a arma de Lewys, que o padre John guardava no altar da igreja. Johnny é perseguido, mas consegue safar-se e encontrar Lewys. Porém, exausto e sem conseguir falar, ele  tem dificuldades pra narrar os acontecimentos. Usando um garfo e uma faca, desenha uma cruz, para informar Lewys sobre a morte de seu irmão gêmeo, e, em seguida, ambos retornam para caçar os criminosos. A partir daí as coisas esquentam e há muitas passagens fortes e bem coreografadas, mas não as comentarei aqui, pra não estragar a graça a quem não as viu ainda. Uma única nota é quanto a Lewys, que resolve usar um estratagema para conseguir vingar-se. Ele retorna como uma espécie de fantasma a assombrar os algozes de seu irmão. Uma leitura possível dessa imagem é a referência à consciência atormentada, que muitas vezes persegue quem comete certos tipos de crimes. Talvez lembre ainda o possível mau-agouro de profanar o que é sagrado, ou o perigo de opor-se à força divina e à ordem transcendente.
A fotografia do filme é sóbria, e não usa de artifícios para criar determinados tipos de atmosfera. É uma reprodução fiel das cores naturais, quase sem psicodelismo. Um recurso, muito recorrente nos euro-western, o do uso do zoom, poderia ter sido evitado em alguns momentos, embora isso não chegue a constituir um defeito grave na película. Alguns ângulos e trabalho de câmera são mesmo interessantes, mas sempre mantendo um bom nível de equilíbrio, sem exageros retóricos.
Gosto muito da música burlesca do filme, mas creio que houve excesso no uso apelativo da mesma. Isso prejudica um pouco a atmosfera de tensão do filme. De fato, se há um defeito grave no filme, é esse: o fato de a tensão narrativa ser quase inexistente. Fora isso, é um filme que conta com um cast sofisticado de atores, com boas atuações, exceto algumas interpretações histriônicas, em cenas, sobretudo, de ação, por parte de alguns poucos atores menos relevantes na trama. Outra crítica que se poderia fazer é quanto à postura do padre John, que afora a batina, parece ser a de um pistoleiro frio. Mas isso pode ser explicado por seu passado obscuro. Há ainda alguns pequenos defeitos técnicos, que passam despercebidos seguramente a muita gente, mas nada, como disse, muito relevante.
Para quem gosta de cinema enquanto experiência artística autocentrada, sem preocupações maiores com elucubrações filosóficas, ou seja, arte pela arte, e gosta de cinema western, vale a pena conferir, ou rever esse filme.
Diamante Lobo não entra, ainda, no grupo dos euro-westerns épicos ou clássicos, mas tem algo de aprazível, talvez o jogar de forma livre com o imaginário, ultrapassando certos códigos, arriscando e produzindo um western que se identifica muito com o caro período em que os cinemas nos interiores lotavam para ver histórias que subvertiam a lógica e assinalava o nascimento de um novo cinema e de um novo mundo, pleno de transformações. Uma curiosidade, a esse respeito, é ver o irmão do padre, Lewis, usando brincos àquela altura e em um filme dessa natureza, numa efeminação consciente do macho infalível em voga na época.
No Brasil, foi lançado em VHS e em DVD algumas vezes, mas a edição que apresenta melhor qualidade, em termos de preservação do espetáculo original é a da Fox, sua distribuidora. Entretanto, o desrespeito, comum no mercado brasileiro, permitiu que a edição lançada fosse realmente medíocre. Para quem não gosta, de cara tem de se contentar com a embalagem slim. A ausência de menu, ou de qualquer extra que seja, é outro defeito da edição, que apresenta uma imagem boa, mas letterbox, falha grave que poderia ter sido evitada. Como aqui é Brasil, pelo menos agradecemos a preservada integridade da imagem original. Outro defeito grave é não oferecer a opção de áudio original italiano, coisa rotineira por estas plagas.
Mas, deixando de lado a ridícula “pirataria oficial”, podemos dizer que, em suma, embora reconheçamos suas limitações, Diamante lobo é uma pequena peça. Um pequeno diamante de que gosto muito.








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