16 de maio de 2015

Dos diálogos em linguagem simples



Partidos e políticos populistas, mesmo corruptos, ou sem aptidão para administrar, conseguem dialogar com o povo porque falam exatamente A Linguagem do Povo. Esse eficiente código de feição rudimentar surge pelas mãos dos eminentes políticos, figuras capazes de fazer a talha crer ser cada propagandista um dos seus. “Esse é gente boa”, “gente simples”, “gente como a gente”, diz a turba após ouvir um deles. Os discursos, cheios de bravatas, são como os do povo; como o povo, em sua essência disforme, se refere a seus feitos, às suas capacidades, amplificadas ou imaginárias; o vocabulário raso, repleto de palavras grosseiras, as frases banais de efeito, recheadas de chavões e exaltadas no tom, são, não raro, como o povo comunica; a argumentação, no geral, rasteira, inclui piadas, apelidos maldosos, rótulos, acusações e ameaças vulgares aos adversários, sem preocupações com a existência de provas ou de fundamentos, exatamente como se vê nas brigas em meio ao povo; nessa linguagem não há espaço para postura equilibrada, mediadora, tranquila. No palavreado complementar do vestuário, quase nada de ternos, quase nada de gravatas ou asseios exagerados; antes uma vestimenta básica, despida de altivez, e, se necessário, suada e amarrotada, conforme o gosto do povo, que se incomoda demais com gente ajeitada e elegante. Ademais, um banho desconexo de ideologias baratas, mentiras e anúncios de presentes - o que todo o povo adora; promessas de salvação de vidas, e de almas, exaltação da grandiosidade do povo, da cidade, do país, e demonstração inequívoca de ódio pelos inimigos do povo. Pronto, taí a receita básica que qualquer partido ou espertalhão ambicioso pode usar para enganar o povo, e mantê-lo sempre povo; sentindo-se altamente valorizado e transbordando de povo no poder lutando pelo seu jeito de ser povo; pelos seus ideais elementares de continuar eternamente assim, povo, renovando de tempos em tempos sua paixão piegas pelos ídolos da vez, que, no anúncio, vivem como povo, junto com o povo, mas dissimulam uma segunda vida, toda cheia de luxo, bens, dinheiro, regalias; enfim, uma vida gourmet, muito diferente da vida do iludido povo. E nenhum sabido pode descuidar: chegando ao poder, quase tudo se pode esquecer, mas jamais a linguagem do povo; e menos ainda deixar de distribuir pequenos agrados ao povo, que costuma ser muito grato a quem lhe estende a mão nas horas de dificuldade, ou seja, a qualquer hora. O povo se ama, cada pessoa do povo se ama perigosamente, muitas vezes sem qualquer explicação; e quem ama quem se ama não precisa amar mais ninguém. Quem gosta de receber presentes que lhe caem muito bem, sem erro de número e de gosto, certamente não vai exigir de brinde uma cidade, uma palavra ou um país.



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