Tirar sozinho o
prêmio de um bilhete? Não. De nada adianta morar no paraíso se ele está morto
em você. Fortuna, como o sucesso, qual sejam, só podem ser realmente úteis como
parte, nunca o todo. A felicidade é construção que principia no abismo do ser,e eterno miserável aquele que a procura após si. E as melhores coisas não se
compram. Mesmo um pobretão as pode ter. Felicidade é uma delas. A principal. Cada vez menos pessoas acreditam
ou entendem isso. Não percebem que o ar não é a fumaça nele impregnada. Pior. Os
jovens se contaminaram facilmente com a descrença, e entregaram-se à ideia da inevitabilidade
de todo o mal. Prenunciam um futuro sórdido. Sem as esperanças que movem o
homem e o justificam. Afinal, são eles os escritores do amanhã. Fujamos, pois,
à corrida que nos rouba da vida. E a vida. Reorganizemos as prioridades humanas...
Não guardemos as cuecas na gaveta dos talheres.
É preciso mais
que trilhar o caminho. É preciso abri-lo. Fazer a picada. Às vezes tirando
pedras enormes de adiante. Mas se um passar, outros passarão.
Não existe uma
forma só de ser feliz, e a felicidade nunca terá a pureza de uma gema ou a
constância das marés. Mas não há objeção a que, mesmo com todo o auxílio, dos poetas,
ou dos desejos, não sabemos o que é, e como ser feliz. A vida foi entregue
quase toda aos afazeres da lida, do trabalho diário que nos enfiaram pela mente,
como se fosse isso viver. Construir a realidade é a razão essencial do trabalho;
e é verdade que essa constrói o homem quando por ele construída. Mas viver é ainda
mais! Não é tão claro quanto parece óbvio o truísmo de que precisamos de
dinheiro para sobreviver. Essa obviedade quem criou foi o modo de vida. Mas ela
está aí, existe. Sim, existe. Mas sobre a faina louca pesa que ela arrestou
quase todo o tempo. E o melhor. O tempo de luz e de cores.
É preciso alargar
e reformar o tempo de viver com os que amamos; mas não o tempo frívolo do
boteco. E para tal, é preciso antes educar as pessoas para a vida, o que a estulta
escola não faz. Que se encontre jeito. Trabalhar é sobreviver, produzir é viver,
amar é ser feliz; e amar não é uma teoria no vazio, é um verbo de ação, de
coração, que exige que se construa uma vida de alegrias, junto, com quem
amamos; uma vida que passará mais gostosa, mais como correnteza, que não
retorna para se desvelar, e que, ao fim da caminhada, nos deixará felizes e
orgulhosos de nós mesmos, certos de que talhamos a vereda para o futuro. Isso,
porém, não é algo assim tão simples. Impõe muita ousadia e coragem.
Mas o flagelo do
homem não lhe suprime a necessidade de aprender a viver, de aprender ser feliz.
Antes, a reclama. Comece pondo óculos positivos para enxergar a vida; ou
melhor, vista roupa leve de mergulho e se engolfe nela. Acenda suas luzes para
alumiar os recantos esquecidos e fazer a fotossíntese humana que revigora e fortalece.
Se esforce por dar mais atenção às coisas e às pessoas da sua vida. As que
realmente valem, e, portanto, merecem. Já as que lhe fazem mal, ou não o querem
venturoso, faça-as o menor que puder em seu mundo. Só lembre delas quando não as
puder esquecer. Treine isso. Não há jeito melhor de aprender. Mas, apesar de esquivar-se
às pessoas falsas, que não sabem amar, mantendo com elas apenas o contato
mínimo indispensável, ainda assim, tente ser uma pessoa íntegra e honesta,
inclusive com elas... Trate as pessoas com a educação que muitas vezes elas
não têm.
Acautele-se dos
intelectuais, ou do intelectualismo afetado. O sábio de Rotterdam nos ensinou
que costumam estragar qualquer festa. Não me convide, portanto, para o seu banquete...
A meu favor apenas que sou frugal e sei apreciar. Mas se insistir na imprudência, o importante é
que no mínimo tenha-se-lhe por diante um dos que sabem acatar os outros e as
diferenças.
Seja simples.
Não há felicidade onde não há contentamento e simplicidade. Por isso, a
natureza nos fez limitados. Somos iguais em nossa humanidade. Querer ser mais
do que podemos ser nos angustia e apequena. Os anos ficaram encarregados de nos
restituir pelo menos alguma decência de que nos tenhamos furtado nos anos de
outrora e a consciência de nós mesmos quando nos vai tirando lentamente e sob
nossos olhos a possibilidade de fazer as coisas mais simples da vida.
E nunca descuide
que amor é sensação necessitada de ação para virar amar!
Portanto, compre
bicicleta, tênis, roupa de ginástica, e vá passear no parque, na praça. Junto.
Você e seu parceiro de caminhada; ou você e seus amores. Esposa, filhos...
Parem um pouco para uma água de coco e umas palavras soltas.
Viajem, vão
pescar. Ou joguem videogame, na opção human
versus human.
Aproveite o
jardim, o quintal, uma árvore, a calçada, ou outro ambiente da casa, para se
distrair com coisas banais, como contar piadas, causos, versos, tocar e cantar
juntos.
Leiam bons
livros em companhia uns dos outros. Escutem boa música, largados pelo chão. Dividam
algumas tarefas em casa. Cuidem do seu oásis. Não necessita tanto dinheiro para
criar seu paraíso; se precisa muito mais de imaginação. Lavem juntos os pratos
do jantar, desafinem no karaokê, deem aquela festa em família, cheia de
criatividade. Até os machões tímidos vão gostar. Mulheres, encontrem para esses
padecentes coisas mais leves e menos invasivas; pairam-nos uma segunda vez,
façam-nos rebentar e finalmente nascer.
Que tal cozinhar
a duas mãos? Fazer a maior bagunça na cozinha! Ou Jogar tênis, gamão, banco,
futebol...?
Façam compras
juntos. As mulheres se ressentem nessas horas da ausência da opinião de quem
amam. Por que reproduzir essa tolice de que fazer compras com mulher é chato?
Dividam de verdade, sem vergonhas, esse momento. Ele não tem nada de errado. Uma
coisa sempre se torna chata se estamos predispostos a vê-la como chata.
Encontre também pequenas
distrações para seu deleite. Ache o tempo de se amar. O seu momento. Um banho
longo e tonificante. Já pensou em colecionar alguma coisa? Passar horas
organizando, limpando, alguma coisa especial, desde que não vire vício a
atrapalhar os relacionamentos, é formidável. Mas, fique atento! Evite coisas tipo
passar tempo demais ao computador e à internet, afogando-se de inutilidades.
Torne o tempo útil e produtivo. Uma boa leitura, rabiscar alguma coisa, brincar
com os filhos... Evite dedicar todos os seus fins de semana ao trabalho, mesmo
que ele seja muito prazeroso; lembre que ele é seu, mas não é dos seus filhos, da
sua esposa... enfim, das pessoas próximas de você.
Não perca seu
tempo sendo infeliz, como muitos, pelas calçadas, nos bares, ruminando desgostos
e vertendo ódio disfarçado, se entupindo de bebidas, criadas para enriquecer
alguns e enganar de felicidade milhões. Esses vegetam com o coração cheio de
amargura, tentando enganar a si e aos outros.
Descubra que proteger
suas crias, mulher ou esposo, quaisquer que sejam os motivos, como resguardar
dos olhos ímpios do mundo, não é prendê-los em casa. Isso não ajuda ninguém a
ser ditoso. Pássaros em gaiolas nunca terão o canto belo dos que enfrentam os
perigos de ver a luz e de singrar a brisa refrescante.
Seja econômico
nas brigas. Principalmente por coisas materiais, como um sofá novo, ou aquele
item raro de coleção. Não espere para aprender que elas nunca terão o valor das
pessoas da sua vida.
Fuja dos vícios.
Até da aparentemente inofensiva linguagem rasteira. Eles roubam tudo que alguém
tem de melhor. São catapultas que parecem divertir quando nos atiram para o
alto; porém, só funcionam com usuários sem paraquedas. E os aventureiros devem
ter certeza de que sabem voar e sempre ser lançados convictos de que podem
voltar atrás.
Um detalhe é essencial:
mesmo escolhido, dê grande importância a suas escolhas. Em especial a da pessoa
com quem você vai dividir os anos e os sonhos. Seja cauteloso e seletivo.
Atente para a conversa. Afinal, vocês terão que conversar por anos a fio. As
palavras são anjos ou demônios capazes de levar ao céu ou ao inferno.
Não esqueça de cuidar
para os detalhes. São justamente eles que farão diferença a cada novo dia. Procure
pessoas com qualidades que possa admirar, e em que possa confiar. E cultive
isso em você. A admiração nos faz viajar no outro. A ausência de confiança abre
a porta ao sofrimento. E a faça perceber que, se o seu problema é problema
dela, o problema dela é o seu problema.
Aprenda ainda a ouvir
os pedidos de socorro nos olhos de quem ama. E se permita conhecer o amor. Não
passe pela vida com coisas que se parecem com ele, mas que não são ele. Tenha
pressa. Não deixe isso para amanhã. O amanhã você não o conhece.
E nunca dê
ouvido à língua dos alienados que pensam ser você o alienado. Carregue sempre consigo
uma cópia desta receita. E dê uma cópia a eles. Quem sabe eles não desalienam.
Se não, pelo menos ficarão cheios de vergonha íntima de si mesmos.
Seja o esperto.
Seja feliz!